Sardinha, só em Maio…

Apesar das negociações em Bruxelas para evitar grandes constrangimentos à pesca da sardinha durante o corrente ano, a verdade é que a captura desta espécie encontra-se totalmente interdita até ao mês de Maio e, mesmo nessa altura, poderão existir fortes limitações às quantidades que se poderão pescar.
Neste momento as traineiras de Sesimbra limitam-se a pescar carapau ou cavala, espécies pouco valorizadas.
O governo financiou a paragem total das traineiras durante um mês, o que algumas já fizeram em Dezembro, e outras durante o corrente mês de Janeiro, aproveitando para operações de reparação e manutenção.
Entretanto, a ministra do Mar, em declarações recentes na Assembleia da República, exprimiu a convicção de que o problema “não tem a ver com a sobrepesca, mas sim com as alterações climáticas”.
No entanto, não deixa de ser preocupante o aviso da comunidade científica, de que os stocks desta espécie poderão entrar em colapso: nas últimas décadas, Sesimbra viu isso acontecer a numerosas espécies outrora abundantes. O Conselho Internacional para a Exploração do Mar chegou mesmo a sugerir que a pesca da sardinha fosse totalmente interdita durante um longo período, de vários anos.
Numa visita ao porto de abrigo de Sesimbra, falámos com alguns mestres, que não escondiam o seu descontentamento com esta situação, manifestando a convicção de que há muita sardinha no mar
Carlos Ferraz, mestre da traineira “Princesa de Sesimbra”, disse que, embora não sendo ainda uma informação certa, tem a ideia “que vamos passar das 13 ou 14 mil toneladas de 2017, para as 9 mil e 500 toneladas. Fizemos agora o mês do defeso, foi o mês de Dezembro, e agora, vamos estar Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Maio, em que só podemos apanhar carapau, cavala, ou biqueirão. E só no dia 1 de Maio é que podemos apanhar sardinha. Temos um mês de defeso, em que somos subsidiados. Os outros meses, se nós quisermos parar, está por nossa conta, não temos contrapartidas nenhumas. O problema é que o carapau e a cavala não rendem quase nada: nestes últimos dois anos a cavala tem sido miúda, e então não tem nenhum interesse comercial. Então vamos vivendo com os carapaus, que é o que se pode arranjar, e alguma cavala, que às vezes se apanha maiorzita. Mas não está fácil.”
Carlos Ferraz, no entanto, acredita que há muita sardinha para pescar:
“A costa tem muito peixe. A costa está cheia de peixe, cheia de sardinhas, cheia de cavala, só que não se pode apanhar sardinha. O grande problema que temos aqui é que não chegam cinco meses para dar sustento a estes homens todos. A quota, o que nos dá, penso que este ano, deve ser à volta duns 150 cabazes por dias, uma média de 3 mil quilos.”
Rui Silva, mestre da traineira “Filipa e Irmão”, é originário do norte, e está há pouco tempo em Sesimbra, mas também está pessimista:
“Isto são muitas restrições, quotas muito curtas, muito tempo parado. Só a partir de Maio é que se pode pescar sardinha. Temos estado a apanhar cavalas e carapaus. Biqueirões aqui não há. A malta ali ao norte do porto da Póvoa do Varzim, apanharam hoje biqueirões, mas foi ali para o porto de Aveiro.”
José Pereira, contramestre da mesma traineira, partilha a mesma opinião:
“É um exagero. Está aí sardinha para apanhar, aí na costa! O mar está carregado de sardinha. Se eles andassem aqui na vida da pesca não faziam isso.”

Locais de Pesca

As traineiras de Sesimbra têm pescado em zonas próximas, como o Bico da Agulha (a nascente da vila), mas também têm ido até à embocadura do Tejo, até Cascais: “Hoje pescámos aqui perto do Espichel e temos pescado às vezes ali até Cascais. Estamos sempre a uma hora, duas horas e meia de distância”, diz Carlos Ferraz
O mesmo se passa com a Filipa e Irmão: “Temos pescado ali na barra de Lisboa. E aqui no Bico da Agulha, onde há umas cavalas”, diz Rui Silva “É na área onde se pode trabalhar, pronto! Onde está reserva, não se pode trabalhar. Agora, a sardinha, está aí para apanhar! Ainda hoje, colegas lá de cima, de Vila do Conde, lá para o pé de Matosinhos, apanharam sardinha.

O maior problema é o de sustentar uma embarcação com tamanhas restrições:
“Isto manda um grande balanço a nível de pessoal e despesa”, diz Carlos Ferraz. “A gente trabalhar 5 meses, ou 6, por ano, é complicado a gente aguentar este pessoal todo. Temos pessoal no mar, temos pessoal em terra também a trabalhar… somos vinte e sete homens aqui a trabalhar e manter isto tudo não é fácil.”
Mesmo quando voltarem a poder apanhar sardinha, será em quantidades limitadas:
“E acontece o seguinte: nós muitas vezes temos o peixe dentro da rede e somos obrigados a deitar fora. E toda a gente sabe que a sardinha é um peixe, que quando a gente o devolve ao mar, assim que perder a escama, ele acaba por morrer… O que é que se está a fazer? Estamos a respeitar as leis. Estamos a deitar o peixe fora – que não se pode trazer para a terra – e quando nos arriscamos a trazer, arriscamos a multas, e isso também não é bom, não é saudável para a empresa. A gente não pode andar com autos e mais autos e mais autos e mais autos. Agora, o que eu acho é que se deviam fazer quatro, cinco meses de defeso, mas o ideal era deixarem os barcos trabalhar e apanhar peixe, principalmente a sardinha.

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Director do jornal O Sesimbrense