Etosoto: polémica no Espichel

Os terrenos da Quinta do Morley, no Cabo Espichel, foram adquiridos por uma pequena empresa francesa – a Etosoto – que ali pretende construir uma unidade hoteleira de características ecológicas. No terreno já foram colocadas algumas construções pré-fabricadas e iniciados trabalhos agrícolas.
Esta iniciativa também foi motivo de debate na última Assembleia Municipal, que aprovou uma recomendação à Câmara por causa da interdição que a empresa estaria a colocar ao acesso a caminhos públicos que conduzem a praias e pesqueiros daquela zona.
A Quinta do Morley foi propriedade de António Xavier de Lima, que ali tentou construir uma grande urbanização na década de 1960, sendo ainda visíveis algumas das construções iniciadas e depois embargadas, já que se tratava de um loteamento ilegal.

Com 155 hectares, a Quinta desenvolve-se dos dois lados da estrada que leva ao Cabo: o referido loteamento de Xavier de Lima localizava-se a sul desta estrada, enquanto que o hotel que a Etosoto pretende construir se situa a norte, na direcção da praia da Areia do Mastro.
Trata-se de uma zona integrada no Parque Natural da Arrábida, sendo difícil conceber como é que a estrita legislação aplicável àqueles terrenos poderá permitir o licenciamento do investimento previsto pela Etosoto, ainda que o mesmo tenha características ecológicas.
Num contacto que realizámos com um representante da empresa – o engenheiro Dário Santos – este manifestou-se confiante, referindo que tudo o que pretendem fazer está de acordo com o regulamento daquela zona natural:
– “Este projecto é de dois irmãos franceses, o Julian e o Gregory Labrousse. Através de pessoas que eles conheceram, descobriram este terreno, apaixonaram-se pelo terreno. O objectivo deles é fazer um hotel, que vão ser eles próprios a gerir, é o objectivo de vida deles, é o que eles querem fazer mesmo. O Julian, concretamente, já está num processo de se mudar para cá lentamente, porque quando o hotel abrir ele vai-se mudar para cá com a família dele, de Paris, para gerir o hotel.”

Componente agrícola

A Etosoto, apesar de estar naquele terreno há alguns meses, só há pouco tempo – no dia 20 de Dezembro – é que fez o pedido de licenciamento para o que pretende construir. Uma placa à entrada do terreno esclarece que se trata de um loteamento ainda não aprovado.
No terreno já são visíveis trabalhos agrícolas. Segundo Dário Santos, a componente agrícola é parte intinseca do projecto turístico:
– “Dentro do objectivo de sustentabilidade do próprio complexo hoteleiro, fazia todo o sentido ter produção agricola. A lógica que iniciou essa parte agrícola foi uma área da agricultura que é a permacultura. A permacultura não é só agricultura, é uma forma de estar, que se inicia pela agricultura, porque é a forma mais directa de intervenção na natureza que o homem tem, para tirar proveito para si próprio. Só que tendencialmente faz-se de uma forma em que cooperamos com a natureza, tentamos observar como é que a natureza funciona, em cada zona, para daí conseguirmos fazer um processo o menos negativo possível, que tenha um impacto menos negativo.”
Dário Santos sublinha, nomeadamente, o objectivo de regenerar o solo, poupar água, fazer com que não se perca água:
– “Eu entrei neste projecto, como engenheiro civil, na parte das barragens que vão guardar água, só que entretanto abriu-se a vaga na parte da agricultura, de que eu sou muito apaixonado e já tenho alguns anos de experiência de agricultura biológica e então vim e com o Julian conseguimos melhorar bastante a parte agrícola, ou seja, agora estamos mais virados para manter os princípios de melhorar. Mas vai ser uma agricultura mais profissional, não tanto para os turistas chegarem e verem – vamos ter essa parte também – mas depois vamos ter uma componente mais produtiva, e vamos produzir fruta. Neste momento estamos já a plantar as árvores de fruto, vamos tentar ter a maior variedade possível,estou a fazer um esforço para encontrar variedades portuguesas, por exemplo macieiras.”
Para além da produção de fruta e de legumes, pretendem ainda lançar uma linha de produtos cosméticos, produzidos ali, com as plantas autóctones.
Dário Santos calcula que, em termos de produção agrícola, no final deste ano já estarão a produzir legumes em grande quantidade. Quanto ao hotel, a previsão é de entre um a dois anos.
As construções hoteleiras serão em madeira, e os pavilhões já instalados junto à área agrícola, serão depois deslocados para a zona do hotel, explica Dário Santos. Há uma zona de painéis solares – sendo já visível o início da respectiva instalação. Outra das fontes de energia será a madeira:
– “A floresta que temos, e a que vamos plantar, são mais de vinte hectares no total, que vai servir para fazermos os pellets para o nosso próprio aquecimento: o aquecimento do hotel vai ser feito à base de pellets, aqueles granulados que se metem nas caldeiras, produzidos por nós próprios, com a nossa madeira.”

Polémica com os caminhos de acesso à zona costeira

Anterior ainda ao pedido de licenciamento, é a polémica com o acesso público aos caminhos que atravessam a propriedade, e que já chegou à Assembleia Municipal – veja-se a notícia da página 6 da nossa edição em papel. Muitos desses caminhos conduzem a zonas actualmente muito procuradas por caminhantes na natureza e por pescadores: Forte da Baralha, Baleeira, Areia do Mastro. A própria Câmara está a organizar, com o ICNB, uma rede de caminhos para fins lúdicos, nesta mesma zona.
Refutando as aqueixas, Dário Santos contrapõe que toda a zona junto ao mar é do domínio público, garantindo o acesso a toda a gente, e também que a estrada de acesso à propriedade da Etosoto tem sido utilizada para despejar entulhos e outros lixos – o que pudemos comprovar no local.
Já a fechar esta edição, chegou-nos a notícia, que não pudemos ainda confirmar oficialmente, de que a Câmara Municipal teria embargado as contruções já ali instaladas pela Etosoto.

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Director do jornal O Sesimbrense

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