Miguel Telles Antunes

Miguel Carlos Ferreira Telles Antunes, nasceu em Lisboa a 11 de janeiro de 1937. Licenciado em Ciências Geológicas (Universidade de Lisboa ano 1959), doutorou-se em Geologia (UL ano 1965), fez a agregação na Universidade de Lisboa em 1968, mas integra a Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, onde passou a professor catedrático. Presidente do departamento de Ciências da Terra entre os anos 1984 e 2000, membro da Academia de Ciências de Lisboa desde 1989. Jubilado, é membro do conselho científico do museu da Lourinhã e é diretor do museu da Academia das Ciências de Lisboa e distinguido como Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique.
O jornal “O Sesimbrense” foi conhecer um pouco, uns dos pais da paleontologia portuguesa.

Como surgiu o interesse pela paleontologia?
O interesse pela Paleontologia começou cedo. Interessei-me pela pesca e pelos peixes. Ofereceram-me um dente de tubarão gigante, um “megalodon”. Mostrei-o a um conhecido do meu Pai, o Professor Carlos Teixeira, que me incentivou. O meu interesse pelos fósseis aumentou. Recrudesceu em breve com a oferta de um dente de dinossauro dos arredores das Caldas da Rainha, que vim a oferecer ao Museu da Lourinhã.

Fazendo uma analogia entre os anos 60 do século XX e os tempos atuais, na sua opinião que diferenças poderá enumerar relativamente à investigação sobre a temática dos dinossauros?
Verifico, sem dúvida, um acréscimo de interesse pelos dinossauros, quer institucional quer por individualidades particulares.

Como descobriu a região de Sesimbra, as jazidas de icnofósseis da Pedra da Mua, dos Lagosteiros e a Pedreira do Avelino?
Tendo passado a frequentar Sesimbra, até para proporcionar praia às minhas filhas, visitei a região do Cabo Espichel. Um Colega e Amigo, então vizinho na Venda Nova-Charneca da Cotovia, o Prof. Luís Saldanha, e também seu tio, o arqueólogo Eduardo Serrão (que muito colaborou com o Museu de Sesimbra), alertaram-me para a lenda da Senhora da Mua, bem como para a presença de marcas popularmente atribuídas às pegadas da mula. Pediram-me que as examinasse e procurasse identificar, o que fiz, dando-me conta da existência de vários níveis com tais impressões, produzidas por dinossauros, uns de idade jurássica, outros mais modernos, do Cretácico.

Nessa altura já tinha conhecimento da importância do conjunto das várias pistas, considerado “o mais notável do Cretácico da europa, e o único desta idade em Portugal?“
Dei prioridade ao estudo dos mais modernos, os de Lagosteiros, cretácicos, então inéditos em Portugal, onde já se conheciam pegadas de dinossauros jurássicos no Cabo Mondego. Implicou, naturalmente, intenso trabalho de campo, que proporcionou a colheita de vários gastrópodes e de uma vértebra de dinossauro muito deformada devido à tectónica que afetou a região.
Quanto à Pedreira do Avelino, fui aí, à oficina então existente, para cortar exemplares de fósseis, reduzindo o tamanho e volume dos exemplares sem os danificar. Ao passar na pedreira, vi outras pegadas de dinossauros, que procurei salvar do destino em vista: pedras para revestimento de moradias. Ao fim de algum tempo, consegui fundos através da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa para adquirir ao proprietário as lajes com pegadas. Porém, um acidente levou à reforma do único pedreiro que aí trabalhava, o que interrompeu os trabalhos.

Foi uma descoberta acidental ou já tinha informações que o levaram a um trabalho de campo?
Dando-me conta da importância dos achados, publiquei um estudo – que constituiu aliás a primeira publicação científica da Faculdade de Ciências e Tecnologia – acerca da ocorrência de Lagosteiros. Para este estudo contribuíram as observações, que tive ensejo de fazer, do rico material de dinossauros do Cretácico de Bernissart conservado no Musée Royal des Sciences Naturelles de Bruxelas, enquanto bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian. Não se realizaram pesquisas de fósseis vegetais, conhecidos em Sesimbra através de trabalhos de Carlos Teixeira. No conjunto, fornecem algumas indicações de natureza climática, complementadas por estudos de sedimentologia.

Quais foram os marcos mais importantes que se recorda destes processos?Entretanto, algumas publicações foram produzidas desde o século XIX acerca de fósseis colhidos na Boca do Chapim e na Areia do Mastro, reforçando a importância do conjunto de jazidas paleontológicas regionais, quer a nível de Portugal, quer a nível europeu.

Para além das pegadas dos dinossáurios, chegou a encontrar outras peças? De que tipo?
Neste último quarto de século, verificaram-se atuações no plano científico e, sobretudo, visando proteção dos sítios, que têm chamado a atenção de numerosos visitantes portugueses e estrangeiros. Destaco o contributo de A. M. Galopim de Carvalho e o interesse por parte da Câmara Municipal de Sesimbra, e em particular da colaboração de Paulo Caetano.

Face aos vestígios encontrados como seria a região, os animais, o tipo vegetação e que clima existiria e que tipos de rochas?
Considerando os dados conhecidos, tratava-se de uma região assaz próxima do mar de então, com coberto vegetal variado incluindo coníferas, filicínias e outras plantas, explorado por dinossauros herbívoros e onde também ocorriam dinossauros carnívoros. Clima aparentemente subtropical.

Tem acompanhado as recentes descobertas na Areia do Mastro e na Boca do Chapim?
Tenho tido algumas notícias, mas não tenho acompanhado essas pesquisas em pormenor.

Os recentes achados reforçam a importância da região em termos da paleontologia no continente europeu e no mundo?
Os achados na região conferem-lhe interesse à escala nacional e internacional.

Assinalaram-se os 25 anos da classificação dos monumentos naturais de Sesimbra: a pedreira do Avelino no Zambujal, a Pedra da Mua e os Lagosteiros no Cabo Espichel. Que balanço faz deste quarto de século sobre a classificação destes monumentos naturais?
Parece-me muito positivo o processo de classificação, o qual sublinha o interesse das ocorrências e a necessidade de procurar salvaguardar a sua preservação.

Considera que com o desenvolvimento do geoturismo, fomentaria a consciencialização na preservação deste património natural único?
Parece positivo o papel do geoturismo quanto à consciencialização e preservação deste notável património.

A CMS atribuiu-lhe o medalhão da vila, numa cerimónia na igreja de Nossa Senhora do Cabo Espichel, como encarou a homenagem?
Sensibilizou-me a homenagem e a entrega de medalha pela Câmara Municipal de Sesimbra, distinção que muito me apraz. Dando continuidade à colaboração Municipal, o Encontro Internacional de Paleontologia em Sesimbra reforçou o interesse geral por todas estas matérias.

Na sua opinião, quais foram as conclusões apreendidas do encontro internacional de Paleontologia realizado em Sesimbra?
O Encontro de Sesimbra reforçou o interesse paleontológico de todo o conjunto de ocorrências na região.

Recentemente a residir no concelho de Sesimbra, o que o levou a escolher Sesimbra?
Por todos estes motivos e outros, sempre me agradou a região de Sesimbra, o que me tem motivado para aqui residir.


Pistas dos Lagosteiros: Miguel Telles Antunes e Philippe Taquet, Diretor do
Muséum National d’Histoire Naturelle (Paris) – 6/4/1993


Reconstituição representando uma área litoral, no Cretácico inferior (ca. 125 milhões de anos) – praia abrigada por barreiras de recifes corálicos – com um Iguanodon assente nos pés e na cauda.
Reconstituição por M.Telles Antunes, com acabamento em gouache do Arqº J. P. Martins Barata (original oferecido à Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa).

João Silva

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Fontes: Dinossauros Eocretácicos de Lagosteiros – Universidade Nova de Lisboa UNL Ciências da Terra – maio de 1976
– lusodinos.blogspot.com/2008/11/miguel-telles-antunes.html
– Decreto nº 20/97 de 7 de Maio
– O Sesimbrense nº 736 – 18/10/1981

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Director do jornal O Sesimbrense